Disseminação da Formação “Social Inclusion Through Entrepreneurship (SITE)”

Na manhã cinzenta de 21 de março, ainda se ouviam os ecos distantes da tempestade Martinho. Na véspera, os seus ventos irrequietos tinham sacudido telhados, vergado ramos, espalhado folhas pelo chão. Na véspera, fizera questão de se fazer notar, como se quisesse gravar a sua assinatura efémera nos muros da escola. Agora, o vento acalmara, mas os rastos da sua passagem permaneciam. As poças de água refletiam o céu nublado, os troncos tombados contavam a história de uma noite inquieta. E os guarda-chuvas.

Os guarda-chuvas coloridos, meticulosamente decorados para as Jornadas do Ambiente de Paredes, que haviam dançado alegremente no pátio dias antes, jaziam agora destroçados. As suas hastes torcidas, as lonas rasgadas, como se a tempestade lhes tivesse roubado a esperança de sombra e proteção. Mas no interior da sala, era diferente. Ali, não havia vento nem trovões. Apenas silêncio. Um silêncio expectante, que se demora nos primeiros instantes antes de um acontecimento. Um silêncio que prenuncia algo novo.

Os alunos do 10.º ano de Ciências e Tecnologias ocupavam as suas carteiras, alguns ainda presos ao torpor das primeiras horas do dia, outros já despertos pela promessa do que estava para vir. Entre mochilas meio abertas e cadernos desalinhados, pairavam olhares dispersos e murmúrios contidos. No centro do quadro branco, escrito a marcador azul, um título:  “Inclusão Social Através do Empreendedorismo: Erasmus+”. E abaixo dele, dois nomes: Rui Magalhães e André Ferreira.

Vieram falar de um projeto. Mas acabaram por contar uma história. Uma história de desafios e de oportunidades, de fronteiras que se desfazem quando o conhecimento se partilha. Uma história que começou longe dali, noutro país, noutra cultura, mas que, de alguma forma, encontrou eco dentro daquela sala.  As palavras soltaram-se, prenderam atenções, desenharam cenários. Falou-se de Dalaman, na Turquia, onde a experiência internacional se transformou numa escola viva. Onde técnicos e líderes juvenis moldaram ideias, construíram pontes, reformularam futuros. Onde o empreendedorismo social se revelou não apenas como uma teoria distante, mas como uma ferramenta concreta para mudar vidas.

Os números surgiram no ecrã. 20 milhões de famílias em insegurança alimentar na União Europeia. 12,9 milhões de desempregados. Taxas de exclusão social que continuam a crescer. Fria, impessoal, a estatística desenhava um cenário duro, mas necessário. A realidade precisa de ser encarada antes de ser transformada.  Mas não foram os números que prenderam os alunos. Foram as histórias. Histórias de jovens como eles. Mas nascidos noutras circunstâncias, noutros mundos. Jovens que enfrentaram exclusões, barreiras invisíveis, portas fechadas. Jovens que, com as ferramentas certas, reescreveram os seus destinos, criaram os seus próprios negócios, devolveram dignidade às suas comunidades.

E foi então que a conversa os trouxe para mais perto. Para Portugal. Para a realidade local. Para a Associação Nó Górdio. Porque a mudança não acontece apenas lá fora. Acontece aqui. A Nó Górdio tem sido um exemplo vivo de como o empreendedorismo pode ser um motor de transformação social. Não um conceito vago, mas uma prática concreta. Um meio de capacitação para quem precisa de um novo começo, um novo rumo. Através de projetos internacionais como este, a associação tem ajudado a desenredar os nós que travam o progresso, ligando pessoas, ideias e oportunidades.

E os alunos ouviram.

Mas não foi apenas uma palestra. Não foi apenas um relato de experiências vividas. Foi um desafio. Porque, como disse Rui Magalhães, “Vocês são o futuro. Daqui a dez anos, serão os timoneiros deste país.” E a proposta era clara: não esperar pelo futuro para agir. Ser empreendedores agora. Pensar em soluções, desenhar projetos, perceber que cada um deles tem o poder de fazer a diferença. Não se trata apenas de ouvir, de assimilar, de refletir. Trata-se de fazer.

A sala ganhou nova energia. Murmúrios transformaram-se em ideias, perguntas começaram a surgir, pequenas luzes de possibilidade acenderam-se. Lá fora, o vento já não uivava. As nuvens dissipavam-se lentamente. O sol ainda não brilhava, mas a tempestade já passara. Talvez tenham saído daquela sala não apenas com o eco das palavras, mas com a semente de algo maior. A semente da mudança. Porque, no final, não se tratava apenas de um projeto.Tratava-se do mundo. E de como podemos reinventá-lo.